Ritual de colheita do milho- Huasteca/México

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Durante a minha permanência na Huasteca ainda viveria rituais imprescindíveis para a minha formação profissional, artísitica e espiritual. Quando saí do Brasil, levei comigo uma espiga de milho que me acompanhou por toda itinerância do projeto. Numa tarde aquela espiga brasileira abriria para mim uma oportunidade sem igual de vivenciar os ritos relacionados a sacralidade milenar que este grão ocupa na Mesoamérica.
Duas alunas minhas vieram retirar algumas dúvidas sobre uma atividade que realizaríamos no dia seguinte. Uma delas, Lídia, ao ver em meu quarto uma espiga, me pergunta porque que eu trazia aquele milho comigo.
Eu conto para ela algumas das histórias que eu havia até então vivido com relação ao milho, tanto no México como no Brasil. E digo que já de muitos anos eu tinha adquirido o costume de sempre ter milho entre meus pertences. Lídia então naquela tarde me perguntou se eu não estaria disposto a acompanhar num ritual que seu cunhado estaria fazendo no final de semana seguinte numa casa de costumbre [1] por ocasião da colheita de milho que algumas famílias estavam por realizar.
Eu aceito o convite e me preparo para empreender uma viagem até a casa dela, perto do Município de Chicontepec. Era um sábado, saio bem cedo de Ixhuatlán de Madero. Chego à casa de Lídia antes do almoço. Espero que a família dela organize alguns pertences que teriam que ser levados para o ritual e então saímos num caminhão para um sítio aonde estava já um grupo grande de pessoas, todas elas da cultura nahuatl. Pouco se falava o espanhol. Lídia me apresenta a todos e principalmente a seu cunhado, que era quem estaria dirigindo o ritual ao lado de outros Curandeiros de Maiz[2]. Lídia explica a seu cunhado o objetivo do nosso projeto e pede permissão para que realizássemos as nossas filmagens, o que definitivamente não o fizemos. Para mim aquele momento tinha que ser vivido com toda a integridade, sem preocupar-me com ângulos. Lídia não era nossa aluna mais interessada em aprender a manusear os equipamentos. E naquele dia nenhum aluno nos acompanhava. Não era um dia de trabalho. Durante o projeto, eram raras as ocasiões que eu pegava a câmera para filmar, minha função sempre era como tutor. E naquele dia definitivamente não seria a ocasião para estar diante do ritual empunhado com o equipamento.
Novamente naquela tarde pude acompanhar como que a arte, o processo criativo faz parte do cotidiano ritualístico indígena. A montagem dos altares, a organização dos elementos. Da mesma a forma como a cena ritual era organizada. Havia um cenário produzido para que ocorresse a celebração. Estavam lá todos os personagens, quase todos anciões e anciãs com suas roupas tradicionais. As mulheres com seus vestidos bordados muitas vezes por elas mesmas, nos quais transpõem para suas roupas as imagens das flores de da flora e da fauna sua região. Mostra clara, emocionante de como esta cultura reconhece e leva em sua alma e inclusive em suas vestes, o próprio patrimônio natural e também cultural.
O ritual iniciou no meio da tarde e se estendeu por toda a noite alcançando o amanhecer. Os elementos ritualísiticos que eram construídos com beleza, arte e sensibilidade foram sendo apresentados para mim como se tudo aquilo já fizesse parte de minha alma. Também nos rituais de colheita de milho as flores de Cempoaxochitl são utilizadas tanto para adornar esteticamente com para comover as pessoas com seu olor. Os enfeites florais eram produzidos por senhores, muitos deles, anciões. Aquelas mãos enrugadas tão delicadas tocando e fazendo arcos e buques de flores.
[1]Casa de Costume: Local aonde as famílias organizam os rituais tradicionais.
[2]Curandeiros de Maiz: curandeiros que trabalham com as sementes de milho para ler o passado e fazer prognósticos futuros. São muitas as formas pelas quais se utilizam as sementes para a adivinhação.